27 novembro, 2008

Ao Ritmo Dos Anos 80

Acordei com uma dor de cabeça que tem sido familiar nos últimos tempos e que era suposto desaparecer hoje de vez para todo o sempre. Há algumas dores de cabeça que adoram ficar por mais tempo do que o necessário.

Liguei o rádio (vulgo, iTunes), rodei a roda grande das frequências à sorte (vulgo, liguei o aleatório) e meti o volume no máximo (sim, o volume no máximo é uma linguagem universal e intemporal).

De repente dei por mim aos saltos a cantar: “Hei! Não quero ir pró céu, Hei! Hei! Hei! Só quero twistar-te!”.

Foi preciso os auscultadores voltarem a avariar de um só ouvido para redescobrir os prazeres de ouvir música nas alturas, sem estar preso a um fio e sem algo enfiado pelas orelhas adentro. E sabem que mais? É genial! Ouve-se desde o quarto ao chuveiro, do corredor à cozinha.

E foi então que a minha avó chegou a casa para me ver a fazer uma dança parva, pseudo anos 80, com os braços no ar e a toalha enroscada à cintura.



Preciso mesmo de arranjar uma casa!

Malditos homenzinhos dos serviços académicos...





A Música
Andava eu entretido a tentar nascer e estes senhores andavam a tratar de "rócar" o país. Excelente som para esta banda com múltiplas vidas, mas que não seria nada sem o carisma do senhor Rui Reininho. Um verdadeiro senhor rock star: "estou-me a cagar para vocês todos!" (Ah, o ano é 1984, data deste single dos GNR, Twistarte)


Dito num aparte
Uso-te à la carte
Até que me farte

Atiro-te uma tarte
Depois ponho-te de parte

Vê a minha sorte
(um autêntico corte)
Agora odeio-te de morte
Agora odeio-te de morte

Hey! Não quero ir pró céu
Só quero twistar-te
Uma relação tão forte
Logo que aborte
É bússola sem norte

Uma relação tão forte
E não ficaste a rir-te
Nem tive que mentir-te
É que pra sentir-te
Escusas de despir-te

Hey! Não quero ir prò céu
Nem quero dominar-te.
 

 
     

25 novembro, 2008

Canção De Amor

Abri os olhos num tempo perdido. Devia ser de manhã, já era tarde, de tarde, escuro, quase noite. Não quis olhar para o relógio, sabia que ela já estava atrasada. Os relógios têm uma tendência doentia para me entristecer, nem sei bem porque é que ando sempre com um no pulso, acho que é por causa da animação divertida, quase geek.

Desviei o olhar uns graus para a direita, e ali estava ela, nos meus braços, com a cabeça pousada no ombro. Que visão mais bela e apaziguadora. Lembro-me de ter pensado: "dêem-me uma melodia de fundo e não preciso de mais nada para ser feliz". Mas não tive uma melodia, tive antes uma sinfonia com cada respirar dela, na forma coordenada como o seu peito subia e descia com cada inalação e exalação do ar que parecia tão leve à nossa volta, na forma como mexia lentamente os lábios num sorriso inocente, e na forma como o seu nariz parecia imitar o cantar de um passarinho.

Não sei bem que bem terei feito ao mundo numa anterior encarnação para merecê-la, talvez tenha sido um herói,um rei, um príncipe, um soldado anónimo que desistiu de lutar para ajudar o inimigo, ou um simples livreiro que escondia livros da censura numa cave obscura, atrás das pipas de vinho do Porto.

Sussurrei-lhe tão baixinho quanto pude, com todo o cuidado de não a acordar, passando os dedos por aquele caminho tão perfeito que liga o ombro ao seu ouvido: "és tão bonita".





A Música
Há qualquer coisa dos homens com barba e violas, vão tão bem leite e chocapic, como ter a cabeça no colo da pessoa amada e levar com migalhas na cabeça. Excelente descoberta ao calhas no myspace (http://www.myspace.com/bfachada) de um excelente músico, B Fachada. Mas que grande projecto, a fazer-me acreditar que afinal ainda há coisas novas a descobrir na música portuguesa.


Quando em fins de Março o céu começa a abrir
Dos campos cheira-se a vontade de florir
Começa a caça, os bichos voltam do além
E toda a malta desta praça vê o corpo ver também
Do mar o vai e vem, maestro a dirigir

Os melros cantam: "birds do it"
Os homens cantam: "birds do it"
Viúvas cantam: "lets do it"
Let's fall in love

Quando a orquestra brota toda da estação
E o marinheiro, o marinheiro lembra o Mário com paixão
O tom do velho grego cai no esquecimento
Impera o grande deus manchebo, fogo forte do momento
Pelo mar o bom do vento marca o tempo da canção

Os pombos cantam: "birds do it"
Os homens cantam: "bees do it"
E tu já cantas: "let's do it"
Let's fall in love
 

 
     

22 novembro, 2008

Feridas Abertas (1974)

Passou os dedos pela colecção de discos de vinil para escolher um disco já antigo da sua colecção. Retirou o vinil de Sounds Of Silence dos Simon & Garfunkel e procurou com a agulha a quarta música do lado A. Meteu os auscultadores bem maiores que a sua cabeça e deixou-se estar no seu silêncio. “Era capaz de ouvir esta melodia o dia todo...”, pensou, por cima da música.

Lá fora o seu mundo vivia em revolução, as pessoas pareciam malucas, estavam fora de si com uma liberdade que outrora lhes faltava mas que agora tinham em excesso numa pré anarquia assustadora. “Já só falta libertarem os criminosos todos da prisão, os doidos dos manicómios já andam todos à solta...”, pensou, por cima da música.

Com o pé a abanar no ar ao som da música, ia pensando na sua vida pacata, não tão pacata quanto isso, não tão aborrecida quanto isso. Pensava como podia estar a dar ouvidos a uma voz irritante e doida que não lhe queria sair da cabeça. Não percebia como podia estar a desperdiçar pensamentos com o que alguém doido lhe havia dito. “Maldita dor de cabeça...”, pensou, por cima da música.

As árvores depenadas lá fora e as nuvens carregadas ainda aumentavam mais a sua tristeza. Empoleirou-se no parapeito da janela tentando perceber o que não tinha explicação. Viu uma chaimite a passar lá em baixo, no seu lento passo, a ser ultrapassada por um novíssimo Ford Capri 2.1. “Que contraste mais poético...”, pensou, por cima da música.

Pegou no telefone vermelho que faz o barulho da sineta sempre que se pega nele, e rodou os números, tantos quantos tinha escritos num pedaço de papel já velho e amarrotado. Pela extensão não era um número de cá. Do lado de lá uma voz conhecida reconfortava-o, mesmo que o assunto não fosse o melhor. Pousou o telefone com um novo barulho de sineta e já com um sorriso. “Ainda somos o que fomos...”, pensou, por cima da música.

Fechou os olhos e passou os dedos pela cara dela. Sabia-lhe os contornos de cor. Abriu os olhos e viu o seu próprio reflexo no vidro da janela. “Então é isto a solidão...”, pensou, por cima da música.

Despiu o fato de treino remendado e vestiu as calças à boca de sino e uma camisa colorida com as abas maiores que o necessário. Calçou os sapatos devidamente polidos, vestiu o casaco castanho/forra de sofá, e saiu à rua. Respirou fundo. Foi em direcção ao café. Precisava de cafeína, e de distrair-se. “The only truth I know is you...”, cantou, por cima da música.





A Música
Corria o ano de 1966 quando o Simon e o Garfunkel editaram o fabuloso Sounds Of Silence. O que à partida pode parecer um contrasenso (som e silêncio parecem ser duas coisas que não combinam), à primeira audição faz todo o sentido...


I hear the drizzle of the rain
Like a memory it falls
Soft and warm continuing
Tapping on my roof and walls

And from the shelter of my mind
Through the window of my eyes
I gaze beyond the rain-drenched streets
To England where my heart lies

My mind's distracted and diffused
My thoughts are many miles away
They lie with you when you're asleep
And kiss you when you start your day

And as a song I was writing is left undone
I don't know why I spend my time
Writing songs I can't believe
With words that tear and strain to rhyme

And so you see I have come to doubt
All that I once held as true
I stand alone without beliefs
The only truth I know is you

And as I watch the drops of rain
Weave their weary paths and die
I know that I am like the rain
There but for the grace of you go I
 

 
     

11 novembro, 2008

O Ar Na Minha Mão

Pausa.

Enquanto deixo os ouvidos deslumbrarem-se com som.

Pausa.

Enquanto saboreio os meus lábios.

Pausa.

Enquanto passo a mão pela barba desleixada.

Pausa.

Enquanto vejo o tecto e o reflexo colorido do movimento da música.

Pausa.

Enquanto cheiro o orvalho da noite.

Pausa.

Enquanto penso no sentido da vida.

Pausa.

Penso nos que vão.
Penso nos que estão.

Pausa.

Cidade.
Prédios altos.
Confusão.
Pessoas.
Poluição.
Campo.
Aldeia.
Árvores.
Verde.
Deserto.
Flores.
Cores.
Espírito.
Meditação.

Paz.

Interior.


Calma.

Pausa.

Um sentido para a vida.

Pausa.

Somos feitos de moléculas, moldados por cromossomas, milhões, triliões de pequenas entidades. Não somos um, somos a soma de várias partes. Pelo meio passa a anti-matéria e tudo o que é invisível.

Pausa.

Um sentido para a vida.

Pausa.

O ar fica preso na minha mão.

Pausa.

Logo existo.

Pausa.

Existo como o ar na minha mão.





A Música
Questionam-se muitas vezes sobre como seria o filho do casamento dos Radiohead com os Zero 7? Não precisam de se questionar muito mais, o resultado é este fabulástico Climbing Up The Walls reinterpretado pelo duo de electrónica. Perfeito para escreverem filosofias baratas sobre a vida.


 

 
     

10 novembro, 2008

Eu Queria Tanto Fazer-te Feliz

Eu gostava de ser um contorcionista de balões e que tu fosses uma criança para eu te fazer uma flor de balões e assim arrancar-te o maior sorriso do mundo com esse gesto tão simples, para te fazer esquecer tudo o que é mau.

É uma pena não conseguir dobrar um balão sem o arrebentar.






A Música
Novo single para o mais recente álbum da dupla Mesa, do Porto. Para Todo O Mal é a confirmação de que eles são do melhor que se faz por cá em termos musicais. Excelente, mesmo.


Estou além sono, num sonho de papel, fio de ópio, sombra chinesa tatuada no céu
Hoje não me apetece ser do contra, uma enfant terrible
Quero apenas os novos códigos, quero apenas entrar e participar
Cruzar-me num sonho que seja possivel para ambos

És o meu Anjo da Guarda e eu dou-te trabalho...
Tu és o meu "Homem-Livro", o meu agasalho:
que lê para mim todas as noites, que me levanta sempre que caio
Como eu gostava de retribuir. Como eu gostava de aprender a pedir

Quando as palavras não dizem o que somos

A cidade está submersa numa manhã chuvosa
Pântanos e dinossauros tomam de assalto as avenidas
A menina tem insónias e só às vezes dorme
Desaparece e acorda com fome e acorda com fome
Esta é a minha nova dor. Diz-lhe olá, não a faças esperar

Quando as palavras não dizem o que somos
Gastamos em tinta o que prometemos em sonhos
Quando as palavras não dizem o que somos

Oh! Meu Anjo da Guarda, eu sei que te dou trabalho
Eu e tu somos iguais... eu queria tanto fazer-te feliz...
Não esperes que eu consiga mudar da noite para o dia
 

 
     

04 novembro, 2008

Sala De Espera, Espaço Em Branco

Umas escadas curvilíneas e escuras levavam ao primeiro andar, um enorme corredor de salas exactamente iguais com escritos nas portas a distinguir todo o tipo de profissões, desde advogados, carniceiros, pediatras, ferreiros, contabilistas e canibais. Parei em frente a uma porta exactamente igual a todas as outras, mas com uma placa preta com letras brancas com um nome e uma legenda: “Médico Dentista”. Ri-me com a prepotência desta classe de gente que querem ser médicos a toda a força, apesar de os próprios médicos não os reconhecerem como tal (sendo mesmo proibidos em alguns países de usar o título Dr.).

Entrei e deparei-me com um balcão minúsculo abandonado. Olhei e não vi ninguém, só ouvia o barulho inconfundível e assustador de uma broca a meter medo a uma criancinha, provavelmente. Segui para a sala de espera, um enorme salão apenas com quatro cadeiras tão dispersas que o pareciam tornar maior.

De um dos lados, separadas por três metros uma da outra, estava uma senhora e a sua filha. Olhavam a televisão com o maior ar de aborrecimento das suas vidas. Escolhi uma das duas cadeiras livres e olhei para a televisão, tentando abstrair-me da dor de dentes, à espera que o nimed fizesse efeito, ou então que o dentista me injectasse a porcaria da anestesia de vez.

Não surpreendentemente, a televisão estava na RTP 1. Penso mesmo ser uma obrigação maçónica de todas as salas de espera do país ter a RTP como televisão única, para aborrecer ainda mais as pessoas, entre as montanhas de revistas com mais de três anos. Na televisão, um senhor que antes andava aos saltos com um macaco a ouvir música pimba, agora tentava dar um ar sério, por entre piadinhas leves de carácter sexual para a co-apresentadora, como que a provar de vez a sua homossexualidade.

Virei-me para as revistas estranhamente actuais, entre as quais algumas revistas femininas de mulheres jovens urbanas que querem estar na moda e aprender novas posições sexuais, a contrastar com as revistas para mulheres de meia idade em pré-menopausa com cusquices dos “famosos”, a descrição detalhada do próximo episódio da novela (porque as mulheres gostam sempre de ver a sua novela a saber já o que vai acontecer) e, sim, adivinharam, novas posições sexuais para apimentarem a vida sexual com o marido de bigode e barriga de cerveja que prefere ver futebol com os amigos que ter que passar o aborrecimento de uma noite com a mulher.

Rio-me com a capa da revista que a senhora em frente a mim está a ler, ela pensa que estou a sorrir para ela e ri-se de volta, não sem disfarçar que está a ler a secção de perguntas sexuais parvas de gente que não sabe o que é a internet, na revista Maria.

A menina por esta altura estava já com mais chiclete nas mãos e no cabelo que na boca, mas isso parecia não a preocupar, enquanto olhava lá para fora, para o fim de dia de inverno, uma imagem tão fabulosa que parecia de filme. Mesmo abaixo do céu azul escuro carregado de nuvens, por entre telhados carregados de antenas a negro, reluzia um néon vermelho gigante que anunciava tapetes.

Juro que se tivesse a câmara comigo, tirava a melhor fotografia da minha vida, como não a tinha, deixei-me ficar com a fotografia mental que se ia gravando na minha memória e no meu sorriso.

Se calhar é por as salas de espera serem tão aborrecidas que a paisagem ganha uma vida extraordinária, às tantas até é uma boa técnica que só dê a RTP e só hajam revistas parvas, para as pessoas olharem lá para fora e verem os sítios por onde passam todos os dias, mas nunca reparam.





As Músicas
Sub-valorizados na sua época (segunda metade dos anos 60), os Velvet Underground viriam a tornar-se uma das bandas mais influentes de sempre e os seus membros objecto de culto, especialmente Lou Reed e John Cale. Som excelente, ainda para os parâmetros de hoje!


What goes on in your mind?
I think that I am falling down.
What goes on in your mind?
I think that I am upside down.
Baby, be good, do what you should, you know it will work alright.
Baby, be good, do what you should, you know it will be alright.
I'm going up, and I'm going down.
I'm going from side to side.
See the bells, up in the sky,
Somebody's cut their string in two.
Baby, be good, do what you should, you know it will work alright.
Baby, be good, do what you should, you know it will be alright.
One minute born, one minute doomed,
One minute up, one minute down.
What goes on in your mind?
I think that I am falling down.
Baby, be good, do what you should, you know it will work alright.
Baby, be good, do what you should, you know it will be alright.






Inspirados na folk psicadélica dos anos 60 (não, não tem nada a ver com transe nem raves, nem nada dessas mariquices pós-modernas), os The Coral têm um som fabuloso para descontrair num dia frio e chuvoso (como o de hoje?).


Shut the bedroom window in the morning
Go to the shop, make plans to be leaving
In the morning...
Thought I was sleeping, it was just a dream
An alleycat chewing on dead leaves
In the morning...

Out of the dark and into the light
When the morning comes
I will be alright

When I leave I try not to wake her
Tea and a toast to yesterday's capers
In the morning....

She wrote my name on the red telephone box
When I got there she'd already rubbed it off
In the morning....

Out of the dark and into the light
When the morning comes I will be alright

And all this time I've watched it change
But it's still the same

In the morning...
In the morning...
In the morning...
In the morning...






Completando a série de sons de inspiração 60s, os Little Barrie são um trio inglês caracterizado pela fusão blues/funk, tudo num ambiente de sala de concertos repleta de fumo (coisa aparentemente fora de moda, à conta de leis e jovens rebeldes que parecem não querer ir contra a lei, sobrando daqueles ambientes de antigamente apenas máquinas de fumo mal cheirosas)


Hook a little trick right past the sleeve,
Because the truth just can't be told
Looking for the passport that you need,
To stop the truth fron breaking your soul


Better leave no clues
To tell him what the hell you want
You know it's only late or soon
Before the truth starts rushin' in

Better keep your head down while you wait,
You wanna keep yourself alive
Put a single ball out at the gate,
Then drag your head right up the track

Better leave no clues
To tell him what the hell you want
You know it's only late or soon
Before the truth starts hittn' home

Well if it's sentiments that you want,
Is there anything that i can do?
You got a sunrise bt you don't,
Quit lookin' for a free salute

Better leave no clues
To tell him what the hell you want
You know it's only late or soon
Before the truth starts rushin' in

Yeah, well if it's sentiments that you want,
Is there anything that i can do?
You got a sunrise bt you don't,
Quit lookin' for a free salute

Yeah, be my enemy
Yeah be my enemy
Yeah, is there anything that i can do?

You got a sunrise bt you don't,
Quit lookin' for a free salute
 

 
     

03 novembro, 2008

Dor De Dentes ( Metáfora Filosófica Tão Maior Que A Vida )

Há alturas em que gostava de ser uma máquina para não sentir dor, mas por outro lado estaria a perder tantas coisas boas da vida que uma máquina nunca conseguiria perceber e que nos fazem esquecer a mais persistente dor de dentes (ou o dentista mais carniceiro). Acabo por dar mais valor às pequenas coisas que sempre me fascinaram.

Gosto de estar ali à lareira, de ouvir a irmã queixar-se, a mãe a resmungar que a irmã só se queixa e a avó a rir-se porque a tarde de cartas lhe correu bem.

Gosto do cheiro a castanhas, da jeropiga velha e doce, das unhas doridas e dos sorrisos levemente embriagados que criam o seu próprio Verão de São Martinho a cada gargalhada desmedida.

Gosto de estar ali com os auscultadores (devidamente trocados com o L na orelha direita e o R na esquerda, porque é impossível conseguir ler as letrinhas minúsculas que os distinguem), de ouvir os sons que são a banda sonora da minha vida, com o gato a aquecer os pés, que se faz frio.

Gosto de falar com quem está longe, e de ouvir deles as coisas que se passam aqui mesmo ao lado, de não matar nunca as saudades, de ouvir sempre o mesmo “tens que vir cá”, da falta de assunto que se torna um assunto em si e das cusquices que alimentam a vida.

Gosto de recordar os tempos em que a casa era de toda a gente, da hora do jantar atarefada, dos amigos todos tão diferentes, mas no fundo tão complementares. Dos jantares fora de horas e das saídas ao café do senhor Chico, quer fizesse sol ou chuva.

Gosto de ver o sol a desvanecer tão cedo, do vermelho ao mar, do frio que começa a ser muito, e dos cachecóis partilhados.

Gosto de estar ali naquele quarto, de estarmos tão juntos que perdemos a noção onde começa um e acaba outro, e de partilhar depois um fumos que se misturam e diluem num cenário tão belo de fim-de-tarde de Inverno.

Gosto de sair de casa de manhã cedo, pegar no carro e ver a estrada desaparecer ao ritmo do meu sono e de voltar a casa à noite, com o carro a ameaçar ficar sem combustível, o transito impossível e as conversas muito pouco amigáveis com os condutores chicos-espertos.

Gosto de escrever sobre coisas tão banais que nunca me irão aborrecer, porque afinal é isso que é viver, e é isso que nos faz aguentar as nossas dores de dentes, literais ou metafóricas.



A Música
Adorei o nome da banda, Pete & The Pirates, mas a música passou-me ao lado, depois aconteceu o aleatório do costume, ouvia uma música e pensava: "isto é fixe! o que é isto?". Um dia decidi ouvir o álbum todo e de repente parecia que já o conhecia de cor de tanto ouvir as suas partes aleatoriamente. Excelente ambiente 80s + Indie criado por esta banda inglesa.



 

 

 

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