03 novembro, 2008

Dor De Dentes ( Metáfora Filosófica Tão Maior Que A Vida )

Há alturas em que gostava de ser uma máquina para não sentir dor, mas por outro lado estaria a perder tantas coisas boas da vida que uma máquina nunca conseguiria perceber e que nos fazem esquecer a mais persistente dor de dentes (ou o dentista mais carniceiro). Acabo por dar mais valor às pequenas coisas que sempre me fascinaram.

Gosto de estar ali à lareira, de ouvir a irmã queixar-se, a mãe a resmungar que a irmã só se queixa e a avó a rir-se porque a tarde de cartas lhe correu bem.

Gosto do cheiro a castanhas, da jeropiga velha e doce, das unhas doridas e dos sorrisos levemente embriagados que criam o seu próprio Verão de São Martinho a cada gargalhada desmedida.

Gosto de estar ali com os auscultadores (devidamente trocados com o L na orelha direita e o R na esquerda, porque é impossível conseguir ler as letrinhas minúsculas que os distinguem), de ouvir os sons que são a banda sonora da minha vida, com o gato a aquecer os pés, que se faz frio.

Gosto de falar com quem está longe, e de ouvir deles as coisas que se passam aqui mesmo ao lado, de não matar nunca as saudades, de ouvir sempre o mesmo “tens que vir cá”, da falta de assunto que se torna um assunto em si e das cusquices que alimentam a vida.

Gosto de recordar os tempos em que a casa era de toda a gente, da hora do jantar atarefada, dos amigos todos tão diferentes, mas no fundo tão complementares. Dos jantares fora de horas e das saídas ao café do senhor Chico, quer fizesse sol ou chuva.

Gosto de ver o sol a desvanecer tão cedo, do vermelho ao mar, do frio que começa a ser muito, e dos cachecóis partilhados.

Gosto de estar ali naquele quarto, de estarmos tão juntos que perdemos a noção onde começa um e acaba outro, e de partilhar depois um fumos que se misturam e diluem num cenário tão belo de fim-de-tarde de Inverno.

Gosto de sair de casa de manhã cedo, pegar no carro e ver a estrada desaparecer ao ritmo do meu sono e de voltar a casa à noite, com o carro a ameaçar ficar sem combustível, o transito impossível e as conversas muito pouco amigáveis com os condutores chicos-espertos.

Gosto de escrever sobre coisas tão banais que nunca me irão aborrecer, porque afinal é isso que é viver, e é isso que nos faz aguentar as nossas dores de dentes, literais ou metafóricas.



A Música
Adorei o nome da banda, Pete & The Pirates, mas a música passou-me ao lado, depois aconteceu o aleatório do costume, ouvia uma música e pensava: "isto é fixe! o que é isto?". Um dia decidi ouvir o álbum todo e de repente parecia que já o conhecia de cor de tanto ouvir as suas partes aleatoriamente. Excelente ambiente 80s + Indie criado por esta banda inglesa.



1 COMENTÁRIOS:

Anonymous Anónimo disse...

gosto de te ver com as bochechas de quem exagerou na jeropiga, ainda que só tenhas bebido ice tea ;)*

5/11/08 18:07  

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