Amnésia / Cinco Sentidos / Segredos / Sonhos / Confusão / Mistério
“
O gato miou antes dos dois sons seguintes: O som do cinzeiro pesado de vidro a cair no chão e o som de madeira oca a ser agredida por um cinzeiro atirado a ela por um gato. Aquele som despertou-me a atenção, estava fora do sítio, e logo eu que me apaixono por tudo o que está fora do sítio.
Aproximei-me do local do crime sob o olhar atento do gato falsamente escondido algures no meio do mar de sapatilhas coloridas, como uma pantufa felpuda com o outro par perdido (ou do outro lado da cama). Bati com as dobras dos dedos na madeira do chão e senti a falta de cimento por debaixo dela.
Peguei na velha navalha do meu avô (aquela que agora nunca sai de casa sem mim) e levantei ligeiramente um dos pequenos pedaços de madeira que formam o padrão do chão. Esperei encontrar pó mas, para além disso, encontrei também um canudo de papel cor-de-café (cor de papel envelhecido pelo tempo) devidamente moldado por uma fita vermelha rematada com um laço tão perfeito que deu pena desfazer.
O papel, se a memória não me falha, escondia o seguinte manuscrito sem qualquer referência à data ou ao autor:
(Visão)
Apanhou-lhe dois ou três cabelos anteriormente pousados sobre o ombro nu enquanto deixava que a cor clara se deixasse notar à luz do candeeiro chinês partido de um dos lados mas ainda com toda aquela cor amarelada que lhe era tão característica, a mesma cor dos cabelos dela que agora acariciava suavemente com os dedos.
(Tacto)
Ela passou-lhe a mão pelo queixo (repleto de barba, que a preguiça deixou crescer) antes de o beijar. Dizia que gostava da forma perfeita dele, assim como da forma dos ombros largos que a protegiam num abraço mais longo e apertado do que o costume. Ele pousava as mãos pela sua pele de cetim, a textura mais suave que alguma vez havia tocado.
(Olfacto)
O cheiro do cabelo dela era uma droga que o hipnotizava sempre que enchia o peito de ar para respirar. Adorava tê-la assim, encostada a ele, era toda uma mescla de cheiros, desde a fusão dos cheiros pessoais dos dois, passando pelos perfumes que antes não se notavam e que agora, juntos, pareciam formar um terceiro perfume com fragrâncias nunca antes experimentadas. E depois haviam os cheiros proibidos enaltecidos pelo desejo e exagerados pela libido, cheiros até aqui guardados e agora libertados de uma só vez, qual garrafa de vinho acabada de abrir.
(Audição)
Ouvia-o murmurar qualquer coisa junto do seu ouvido sensível e não queria que ele se calasse mais, adorava ficar com a pele aos saltos a cada sílaba mais abafada pelos sussurros que escondiam os segredos das palavras. Mas ele só falava raramente, parecia-lhe que sabia exactamente o que queria dizer e quando o queria dizer, não dizia tudo o que tinha a dizer de uma só vez, ia dizendo, tinham todo o tempo do mundo, a noite era deles. Quanto a ele, ouvia os suspiros dela como um marinheiro perdido no mar à deriva ouve o canto de uma sereia.
(Paladar)
A sua língua interpretava tudo o que tocava e confundia o cérebro com o maior prazer que se pode dar a uma língua: outra língua. Ela, por sua vez, experimentava novos sabores com cada trincadela na sua pele e não se saciava enquanto não deixava a sua marca, pequenas tatuagens feitas em traços minúsculos da cor da carne.
Voltei a dobrar o papel no seu formato inicial e pedi a uma mulher para fazer aquele laço perfeito, que só a sensibilidade e gosto pela perfeição das mulheres, consegue fazer. Não lhe mostrei o que dizia, apenas o voltei a esconder no mesmo buraco oco por debaixo daquele socalco de madeira insuspeito, igual a todos os outros.
Acordei com este texto escrito numas folhas pousadas sobre a mesinha de cabeceira. Não sei quem o escreveu, nem reconheço a letra. Não sei se fui eu que o escrevi durante um sonho, não me lembro do que sonhei a noite passada...
O gato miou antes dos dois sons seguintes: O som do cinzeiro pesado de vidro a cair no chão e o som de madeira oca a ser agredida por um cinzeiro atirado a ela por um gato. Aquele som despertou-me a atenção, estava fora do sítio, e logo eu que me apaixono por tudo o que está fora do sítio.
Aproximei-me do local do crime sob o olhar atento do gato falsamente escondido algures no meio do mar de sapatilhas coloridas, como uma pantufa felpuda com o outro par perdido (ou do outro lado da cama). Bati com as dobras dos dedos na madeira do chão e senti a falta de cimento por debaixo dela.
Peguei na velha navalha do meu avô (aquela que agora nunca sai de casa sem mim) e levantei ligeiramente um dos pequenos pedaços de madeira que formam o padrão do chão. Esperei encontrar pó mas, para além disso, encontrei também um canudo de papel cor-de-café (cor de papel envelhecido pelo tempo) devidamente moldado por uma fita vermelha rematada com um laço tão perfeito que deu pena desfazer.
O papel, se a memória não me falha, escondia o seguinte manuscrito sem qualquer referência à data ou ao autor:
(Visão)
Apanhou-lhe dois ou três cabelos anteriormente pousados sobre o ombro nu enquanto deixava que a cor clara se deixasse notar à luz do candeeiro chinês partido de um dos lados mas ainda com toda aquela cor amarelada que lhe era tão característica, a mesma cor dos cabelos dela que agora acariciava suavemente com os dedos.
(Tacto)
Ela passou-lhe a mão pelo queixo (repleto de barba, que a preguiça deixou crescer) antes de o beijar. Dizia que gostava da forma perfeita dele, assim como da forma dos ombros largos que a protegiam num abraço mais longo e apertado do que o costume. Ele pousava as mãos pela sua pele de cetim, a textura mais suave que alguma vez havia tocado.
(Olfacto)
O cheiro do cabelo dela era uma droga que o hipnotizava sempre que enchia o peito de ar para respirar. Adorava tê-la assim, encostada a ele, era toda uma mescla de cheiros, desde a fusão dos cheiros pessoais dos dois, passando pelos perfumes que antes não se notavam e que agora, juntos, pareciam formar um terceiro perfume com fragrâncias nunca antes experimentadas. E depois haviam os cheiros proibidos enaltecidos pelo desejo e exagerados pela libido, cheiros até aqui guardados e agora libertados de uma só vez, qual garrafa de vinho acabada de abrir.
(Audição)
Ouvia-o murmurar qualquer coisa junto do seu ouvido sensível e não queria que ele se calasse mais, adorava ficar com a pele aos saltos a cada sílaba mais abafada pelos sussurros que escondiam os segredos das palavras. Mas ele só falava raramente, parecia-lhe que sabia exactamente o que queria dizer e quando o queria dizer, não dizia tudo o que tinha a dizer de uma só vez, ia dizendo, tinham todo o tempo do mundo, a noite era deles. Quanto a ele, ouvia os suspiros dela como um marinheiro perdido no mar à deriva ouve o canto de uma sereia.
(Paladar)
A sua língua interpretava tudo o que tocava e confundia o cérebro com o maior prazer que se pode dar a uma língua: outra língua. Ela, por sua vez, experimentava novos sabores com cada trincadela na sua pele e não se saciava enquanto não deixava a sua marca, pequenas tatuagens feitas em traços minúsculos da cor da carne.
Voltei a dobrar o papel no seu formato inicial e pedi a uma mulher para fazer aquele laço perfeito, que só a sensibilidade e gosto pela perfeição das mulheres, consegue fazer. Não lhe mostrei o que dizia, apenas o voltei a esconder no mesmo buraco oco por debaixo daquele socalco de madeira insuspeito, igual a todos os outros.
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Acordei com este texto escrito numas folhas pousadas sobre a mesinha de cabeceira. Não sei quem o escreveu, nem reconheço a letra. Não sei se fui eu que o escrevi durante um sonho, não me lembro do que sonhei a noite passada...
As Músicas
Elizabeth Caroline Orton, ou Beth Orton para os amigos (que somos nós) é uma inglesa que começou por fazer vozes para os Chemical Brothers e que entretanto evoluiu para um som muito próprio, repleto de ambientes que misturam a realidade com aquele pedacinho de mundo que é só nosso, que é a nossa visão dele (o mundo).
Running down a central reservation.
Last night's red dress
And I can still smell you on my fingers
And taste you on my breath.
Stepping through brilliant shades
Of the color you bring
But this time, this time, this time
Is whatever I want it to mean.
If this is where memories are made,
I'm gonna like what I see.
And everything I ever took for granted,
I'm gonna let it be.
I step through every shade
Of the color you bring
But this time, this time, this time
Is whatever I want it to mean.
And everything and nothing is
As sacred as we want it to be
When it's real. Make it real.,
Compared to what?
Ooh yeah yeah yeah yeah, yeah yeah
Ooh yeah yeah yeah yeah, yeah yeah
It's like living in the middle of the ocean
With no future, no past,
And everything that's good about now
Might just glide right past.
I'm stepping through brilliant shades
Of the color you bring.
But this time, ths time, this time
Is fine just as it is.
And everything is sacred here,
And nothing is as sacred as I want it to be,
When it's real.
Compared to what?
Ooh yeah yeah yeah yeah, yeah yeah
Ooh yeah yeah yeah yeah, yeah yeah...
Ba da ba, ba da ba, ba da ba ba ba da ba, yeah yeah
Ainda não tinha aqui falado de Beirute, a capital do Líbano e local de muitas mestiçagens, mas já tinha falado de Beirut, o improvável e irrequieto californiano que se apaixonou pelos sons da Europa de Leste. Pois é, o rapaz está de volta com mais uma publicação para 2007, depois dos EPs Pompeii e Elephant Gun e depois do LP Gulag Orkestar e do EP Lon Gisland ambos do ano passado (ufa! ainda bem que o ano já está a acabar). Deliciem-se com este fabuloso Nantes para o novíssimo The Flying Club Cup.
Ah e não percam também este vídeo da música tocada ao vivo nas ruas de Paris para a La Blogotheque.
Well it's been a long time, long time now
Since I've seen you smile
And I'll gamble away my fright
And I'll gamble away my time
And in a year, a year or so
This will slip into the sea
Well it's been a long time, long time now
Since I've seen you smile
Nobody raise their voices
Just another night in Nantes
Nobody raise their voices
Just another night in Nantes
5 COMENTÁRIOS:
apaixonei me pela tua entrie.esse texto despertou me borboletas na barriga,as fotografias fizeram me sonhar e a música deu me sorrisos :)
bolas,foi muito bom ter noticias tuas!vê se não desapareces outra vez...
ou pelo menos,vai mandando postais dos sítios por onde andas ;)
espero que já nao estejas tão doentinho.beijinho em ti*
Possa rapaz, que tu nem mesmo aleijadinho paras quieto por um momento.
Tinha todas aquelas histórias mais-que-interessantes de África para te contar mas as minhas ideias de te impressionar caem sempre por terra quando te ouço falar do dia-a-dia...
E esta história estão tão linda, bela, ligeiramente erótica, poética, tão tu!
Mais um beijo carregado de saudades!
"sob o olhar atento do gato falsamente escondido algures no meio do mar de sapatilhas coloridas, como uma pantufa felpuda com o outro par perdido (ou do outro lado da cama)";) adorei particularmente.
beirut que coincidencia, ainda ontem falamos sobre ele, ainda hoje de manhã passei um bom tempo na net a pesquisar algo que não fosse expontaneo e muito menos ao vivo sobre ele e o owen pallett,mas ainda nada... que coisa irritante:/
asteriscos*
Ó meu querido não temos falado nada. Não tenho tempo para tratar de ti assim todo aleijadinho.
lol
Agora que não tenho mais frequências e que já estás cá por cima(!) podemos compensar o tempo perdido.
Beijo******!
=) tenho cartas para ti. stop. morada? stop.
see u soon
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