Medos
"O que é que se faz a quem quer manter a distância? Continuamos a figura de parvos com tentativas falhadas de aproximação ou damos um passo atrás?", perguntou-me a única pessoa que ainda me percebe, à distância de um telefonema mas ainda mais próxima do que vai estar nos próximos tempos.
Parei um pouco para sacudir a cabeça, na esperança de ver cair o chip microscópico com que ela me lê os pensamentos. Como não o encontrei, presumi que estava implantado no pescoço, ou então que talvez ela fosse mesmo parecida comigo.
"Não sei...", resisti à tentação de responder com um clichê qualquer generalista e continuei, "Às vezes apetece tanto dar esse passo atrás ou, pelo menos, ficar quieto no mesmo sítio, mas essas pessoas nunca se vão mexer, estão agarradas a um orgulho estúpido que não sei descrever."
"Será medo?", perguntou ela tentando acertar a peça do puzzle onde ela não encaixava.
"Medo? Medo de quê?", perguntei preplexo.
"Há pessoas que têm medo, sabes?"
Encurrilhei a testa, dei duas reviravoltas de 360º com os olhos e continuei a série de perguntas sem resposta, ou perguntas respondidas com perguntas: "Não consigo perceber isso. Porque é que as pessoas haverão de ter medo?"
"Vou-te contar uma história", disse ela com uma voz desleixada tentando imitar sabe-se lá quem, "Havia uma criança que uma vez comeu um gelado com pintarolas, mas as pintarolas estavam estragadas e o gelado fez uma intoxiacação alimentar à criança. A partir daí a criança ficou com medo de comer gelado com pintarolas".
"Não tens jeito nenhum para contar histórias...", desmotivei-a pensando na minha própria falta de jeito para improvizar histórias em cima do joelho, "Não acho que seja esse medo, acho que é mais medo de não estar à tua altura".
"Ainda estamos a falar de pintarolas?", perguntou com o seu melhor sarcasmo.
"Não.", ri-me alto para grande indignação do gato que descobriu a pequena bola de metal pela primeira vez, pela trijésima vez hoje, "Estou a falar de ti."
"Não vejo porquê"
"Porque ele está apaixonado por ti", disse quase a sussorrar, como que a dizer um segredo.
"Continuo a não perceber. É esse o medo dos homens?", perguntou com a grande expectativa de talvez ter descoberto a solução universal para todos os problemas.
"Sim, entre outros.", respondi declarando o que para mim era óbvio e uma verdade universal desde o início dos tempos.
"Vocês têm uma forma estranha de dizer as coisas que sentem", constatou desiludida com a tradução de coisas intraduzíveis.
"E vocês têm uma forma estranha de não dizer as coisas que sentem", constatei agora eu dizendo outra verdade universalmente aceite entre todos os homens.
"Temos medo."
"Então temos todos medo uns dos outros?", perguntei quase que retóricamente.
"Basicamente.", respondeu com a maior frieza do mundo, como se não houvesse solução nem esperança para nada.
"Como é que podes ter medo depois de saberes que as pintorolas estão dentro do prazo?", voltei à fábula da criança e das pintarolas na esperança de tentar perceber finalmente qual a origem do medo.
"Mas eu não sei isso", respondeu não respondendo, ficando a pergunta que não é suposto ser respondida por responder.
"Acabei de te dizer", tentei uma última vez, em vão, obter uma resposta válida.
"Mas eu não sei se isso é verdade. E como é que podes ter medo depois de saberes que as pintarolas foram feitas só para ti?"
"Mas eu não sei isso"
"Porquê?"
"Porque as pintarolas não falam"
"Então voltando à minha pergunta inicial. Qual é a solução, dar um passo atrás ou esperar que as pintarolas comecem a falar?"
"Não há forma de conciliarmos os medos?"
"Não..."
"Então não sei responder à tua pergunta. Talvez haja uma pintarola perdida algures que saiba falar"
"E se não houver?"
"E se houver?"
(Dramatização de uma longa conversa com a Martinha)

A Música
Os irlandeses The Thrills são... irlandeses e mais qualquer coisa. De referir que tiveram dois excelentes albuns, So Much for the City, em 2003 e Let's Bottle Bohemia no todo o poderoso 2004, de onde saiu esta Not For All The Love In The World. O ano passado lançaram o álbum Teenager, mas... vá, não esteve à altura dos outros dois. De referir também a obra de arte que é o vídeo: YouTube.
You show your age,
when you drown your rage.
But I see past those laughter lines,
so baby, lets split tonight,
I got a tank full of gas till light.
Yeah we can drive for miles and miles
But you just said,
Not for all the love in the world
Not for all the love in the world
Cause she didnt realize, now thats a lotta love
Pipe dreams fade,
and all the underdogs get laid.
Left your heart in the hands of a jugglin clown.
And so you crave recognition,
but the keys to the city were missing
People aren't puzzles to be figured out
But you just said,
Not for all the love in the world
Not for all the love in the world
Cause she didnt realize, now thats a lotta love
Oh Oh
I guess that everybody,
went to a better party, oh no
Not for all the love in the world
Not for all the love in the world
But she didnt realize, now thats a lotta love.
Parei um pouco para sacudir a cabeça, na esperança de ver cair o chip microscópico com que ela me lê os pensamentos. Como não o encontrei, presumi que estava implantado no pescoço, ou então que talvez ela fosse mesmo parecida comigo.
"Não sei...", resisti à tentação de responder com um clichê qualquer generalista e continuei, "Às vezes apetece tanto dar esse passo atrás ou, pelo menos, ficar quieto no mesmo sítio, mas essas pessoas nunca se vão mexer, estão agarradas a um orgulho estúpido que não sei descrever."
"Será medo?", perguntou ela tentando acertar a peça do puzzle onde ela não encaixava.
"Medo? Medo de quê?", perguntei preplexo.
"Há pessoas que têm medo, sabes?"
Encurrilhei a testa, dei duas reviravoltas de 360º com os olhos e continuei a série de perguntas sem resposta, ou perguntas respondidas com perguntas: "Não consigo perceber isso. Porque é que as pessoas haverão de ter medo?"
"Vou-te contar uma história", disse ela com uma voz desleixada tentando imitar sabe-se lá quem, "Havia uma criança que uma vez comeu um gelado com pintarolas, mas as pintarolas estavam estragadas e o gelado fez uma intoxiacação alimentar à criança. A partir daí a criança ficou com medo de comer gelado com pintarolas".
"Não tens jeito nenhum para contar histórias...", desmotivei-a pensando na minha própria falta de jeito para improvizar histórias em cima do joelho, "Não acho que seja esse medo, acho que é mais medo de não estar à tua altura".
"Ainda estamos a falar de pintarolas?", perguntou com o seu melhor sarcasmo.
"Não.", ri-me alto para grande indignação do gato que descobriu a pequena bola de metal pela primeira vez, pela trijésima vez hoje, "Estou a falar de ti."
"Não vejo porquê"
"Porque ele está apaixonado por ti", disse quase a sussorrar, como que a dizer um segredo.
"Continuo a não perceber. É esse o medo dos homens?", perguntou com a grande expectativa de talvez ter descoberto a solução universal para todos os problemas.
"Sim, entre outros.", respondi declarando o que para mim era óbvio e uma verdade universal desde o início dos tempos.
"Vocês têm uma forma estranha de dizer as coisas que sentem", constatou desiludida com a tradução de coisas intraduzíveis.
"E vocês têm uma forma estranha de não dizer as coisas que sentem", constatei agora eu dizendo outra verdade universalmente aceite entre todos os homens.
"Temos medo."
"Então temos todos medo uns dos outros?", perguntei quase que retóricamente.
"Basicamente.", respondeu com a maior frieza do mundo, como se não houvesse solução nem esperança para nada.
"Como é que podes ter medo depois de saberes que as pintorolas estão dentro do prazo?", voltei à fábula da criança e das pintarolas na esperança de tentar perceber finalmente qual a origem do medo.
"Mas eu não sei isso", respondeu não respondendo, ficando a pergunta que não é suposto ser respondida por responder.
"Acabei de te dizer", tentei uma última vez, em vão, obter uma resposta válida.
"Mas eu não sei se isso é verdade. E como é que podes ter medo depois de saberes que as pintarolas foram feitas só para ti?"
"Mas eu não sei isso"
"Porquê?"
"Porque as pintarolas não falam"
"Então voltando à minha pergunta inicial. Qual é a solução, dar um passo atrás ou esperar que as pintarolas comecem a falar?"
"Não há forma de conciliarmos os medos?"
"Não..."
"Então não sei responder à tua pergunta. Talvez haja uma pintarola perdida algures que saiba falar"
"E se não houver?"
"E se houver?"
(Dramatização de uma longa conversa com a Martinha)

A Música
Os irlandeses The Thrills são... irlandeses e mais qualquer coisa. De referir que tiveram dois excelentes albuns, So Much for the City, em 2003 e Let's Bottle Bohemia no todo o poderoso 2004, de onde saiu esta Not For All The Love In The World. O ano passado lançaram o álbum Teenager, mas... vá, não esteve à altura dos outros dois. De referir também a obra de arte que é o vídeo: YouTube.
You show your age,
when you drown your rage.
But I see past those laughter lines,
so baby, lets split tonight,
I got a tank full of gas till light.
Yeah we can drive for miles and miles
But you just said,
Not for all the love in the world
Not for all the love in the world
Cause she didnt realize, now thats a lotta love
Pipe dreams fade,
and all the underdogs get laid.
Left your heart in the hands of a jugglin clown.
And so you crave recognition,
but the keys to the city were missing
People aren't puzzles to be figured out
But you just said,
Not for all the love in the world
Not for all the love in the world
Cause she didnt realize, now thats a lotta love
Oh Oh
I guess that everybody,
went to a better party, oh no
Not for all the love in the world
Not for all the love in the world
But she didnt realize, now thats a lotta love.
4 COMENTÁRIOS:
As mulheres não são todas iguais, e os homens também não. Tu certamente não és igual a nenhum homem :D
Até logo!
Boa sorte com o teimoso do meu irmão. Ah e se conseguires pôr um homem a dizer isso da fotografia, és o meu herói!
Este comentário foi removido pelo autor.
Tu e a Marta dão-se mesmo bem. Vai ser uma pena se ela for. Apeguei-me mmo a ela. É como se diz por aí, é impossível não gostar nem dela nem de ti :)
Beijo*****!
embriaguez de beijos* (se é que isso existe!)
Enviar um comentário
<< Voltar